quarta-feira, 10 de setembro de 2014

E a primeira vez é a sempre a última chance...

  Estava lembrando hoje da mais antiga recordação que guardo de sentar à mesa para uma refeição com meu pai. E a memória, como poucas vezes, me pareceu tão clara, como se fosse ontem. Talvez por que, de fato, foi, literalmente, ontem (08 de março de 2014). 
  Uma coisa tão corriqueira para a maioria mas que eu tive que esperar mais de duas décadas para tal evento.
  Vou aproveitar a lembrança ainda vívida e registrar, para que eu mesmo não esqueça... sabe-se lá quando isso vai (se é que vai) acontecer de novo.

(resumindo) Tinha combinado de ir , pela primeira vez desde que eu tinha uns 11, 14 anos, à casa de meu pai (que estranho usar esta palavra) para acertarmos um outro assunto que, no momento, é irrelevante para o entendimento deste registro. Fui até lá em meu horário de almoço no trabalho, conforme havíamos combinado. Era pra ser coisa rápida, não mais que 15 minutos, calculei.
  Eis que, para minha surpresa, meu pai me convidou para ficar e almoçar com ele e sua atual esposa. Bem que tentei me desvincilhiar, educadamente, do convite mas, não sei bem por quê, diante de uma breve insistência, acabei aceitando.
  O almoço, porém, ainda levaria alguns minutos para ficar pronto e ser servido. Meu pai então me convidou a sentarmos na área, enquanto esperávamos. Puxei uma cadeira, ele sentou-se ao lado noutra.

N.A.: vale aqui salientar que não lembro de ter tido com ele uma conversa por mais de 10, 15 minutos.

  Depois de um breve e até desconfortante silêncio de ambos, trocamos algumas palavras, sobre algo que não lembro. Sim, eu estava nervoso. Queria não dizer nenhuma besteira, para que, naquelas poucas palavras trocadas, conseguisse, de alguma forma, trasnpassar a ele o pouco da cultura que acumulei, a educação que minha mãe me transmitiu sem qualquer ajuda dele e também os milhares de sonhos que carrego em mim. Acho até que gaguejei algumas vezes, tamanho nervosismo. Mas sei que não é possível transmitir, apresentar, a essência total de um ser humano, a praticamente um estranho, em aproximadamente uma hora de conversação, mesmo sendo este estranho seu progenitor.
  Em determinado momento, algo me chamou atenção: um dos dois cães da casa, veio sentar-se aos pés de meu pai, que fez um afago na cabeça do velho cão. Uma reflexão se fez em minha mente e martelou meus pensamentos.
  Fomos, enfim, informados que o almoço já estava pronto e nos dirigimos à cozinha, acabando com aquela conversa sem um assunto em comum entre os interlocutores, que me pareceu durar uma eternidade, por não saber bem o que dizer. Por fim almoçamos.
  Deixo aqui registrado, para que minha memória não me seja traidora, como já me foi outras tantas vezes, a primeira refeição (de que consigo me lembrar) ao lado de meu pai... e também, e talvez principalmente, o exato momento em que percebi que naquele afago, mesmo que tenha sido o único na vida daquele cão, ele, o cão, recebeu de meu pai mais carinho que eu já recebi dele em toda minha vida.

(escrito em 09/03/2014)


Marcelo Rutshell.

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